Há Cada Vez Mais Gente a Mexer no Nosso Queijo

quinta, 16 agosto 2018 22:02 Escrito por 

PARTE 6/14: A Comunicação 

A Comunicação é, muito provavelmente, a maior fragilidade do sector do queijo em Portugal. Seja a comunicação comercial (e, em especial, a publicidade), seja a comunicação institucional, seja a comunicação mais genérica, capaz de promover o incremento dos níveis de consumo, mas também o alargamento dos hábitos desse mesmo consumo.

Em termos de comunicação comercial, a única relevante restringe-se a três ou quatro marcas, de produtos muito massificados e, reconheçamos, muito banais. Mais destinada a defender os níveis de consumo existente, do que empenhada em conquistar novos consumidores ou promover novos momentos de consumo.

E se é verdade que o queijo tem uma penetração muito elevada nos lares portugueses, é também verdade que essa penetração se faz com apenas uma pequena parcela dos queijos disponíveis no mercado, de baixo valor e de restritas opções em termos do próprio acto ou momento de consumo.

Em consequência, as capitações nacionais têm tido uma evolução pouco expressiva, sendo o respectivo crescimento marginal e o nível de consumo muito distante de outros países que nos são próximos no contexto europeu.

A atomização do tecido produtivo e a proliferação das marcas pode ser considerado um argumento para estes baixos índices de comunicação. Afinal, as pequenas empresas têm pouca capacidade de investimento em diversas vertentes e a comunicação não é uma excepção. Mas, pensemos em sectores produtores que em Portugal têm um perfil idêntico – veja-se o vinho ou o azeite – e é fácil perceber como, apesar disso, conseguiram conquistar a atenção dos media, dos fazedores de opinião e de faixas crescentes de consumidores, dando-lhes reputação e glamour, mostrando diversidade e originalidade.

Por outro lado, como é sabido, o leite e, de alguma forma, os restantes produtos lácteos (onde se inclui, claro, o queijo) tem sido violentamente atacado pelos supostos malefícios que causam à nossa saúde e também pelos alegados problemas ambientais e de bem-estar animal que estarão associados à produção leiteira e à indústria de lacticínios.

Esta tem sido, de forma crescente, uma batalha de complexidade que não cessa de aumentar e é uma batalha global, muito embora no nosso país, ela esteja também a tocar as raias do absurdo.

E é, essencialmente, uma batalha de comunicação, em que o sensacionalismo, a demagogia e a pseudo-ciência tem conquistado doses crescentes de atenção, enquanto o sector se limitou – durante demasiado tempo – a esperar que a tempestade passasse, a não usar as mesmas tácticas de desinformação para ‘não-descer-ao-mesmo-nível’ e a limitar-se a dizer que a ciência tem comprovado, estudo após estudo, que os benefícios retirados do consumo do leite e seus derivados supera amplamente as pontuais contraindicações existentes, o que sendo verdade não pode ficar apenas no ‘grande baú’ dos factos a consultar apenas se necessário.

Este é um campo em que, nesta altura, todos os trunfos são poucos e têm que ser jogados, objectiva e rapidamente. Daí a necessidade de uma estratégia que envolva muito da sociedade civil que não tenha interesses directos no sector, sejam os responsáveis políticos, os opinion makers, os profissionais de saúde ou as figuras públicas.

Mas de uma forma um pouco egoísta, é também fácil perceber que muitas das acusações formuladas estão quase exclusivamente direccionadas para o leite-matéria-prima e o leite-bebida e que alguns dos aspectos que supostamente escandalizam os seus opositores, são mitigados ou pura e simplesmente não se aplicam ao queijo. Daí que, até por esta via, uma comunicação adequada, que sem penalizar o leite ou qualquer outro produto lácteo, realce as propriedades do queijo e as vantagens do seu consumo, pode ser assertiva e ganhadora.

Mas aqui, estamos a falar de estratégias de comunicação que têm impacto à escala global e em que Portugal e o mercado português são uma pequena roda-dentada numa grande máquina carregada de rodas-dentadas.

Voltando mais especificamente ao queijo e a Portugal, são, actualmente, raros os trabalhos sobre o queijo que encontramos na nossa comunicação social e grande parte deles limita-se a debitar meia dúzia de parágrafos encontrados na Wikipedia ou nas primeiras entradas de uma qualquer busca no Google. Uma grande parte dos pseudo-especialistas conhece mal os queijos que se produzem em Portugal e refere-se a três ou quatro regiões demarcadas de forma genérica que é o que reconhece mais do que conhece.

Os poucos verdadeiros especialistas tendem a exagerar no seu purismo, mais preocupados, na sua comunicação, em defender pequenas quintas do que em apresentar a ampla paleta de sabores e texturas que o queijo nos pode oferecer. E, demasiadas vezes, estão presos a referências muito tipificadas e muito tradicionais - que todos reconhecemos de elevada qualidade – acabando por tornar-se avessos a qualquer inovação ou diferenciação e, de alguma forma, limitando a evolução e o potencial de crescimento da fileira.

Essa reduzida comunicação não chega ao consumidor, como também não chega aos opinion makers, às nossas escolas de turismo ou aos nossos principais chefes de cozinha.

Na verdade, contam-se pelos dedos de uma mão (e ainda sobram dedos) aqueles que, com alguma regularidade, dão a cara pelo queijo, que assumem sobre ele um discurso minimamente coerente e que não se limite a utilizar os chavões da net ou as preocupações (legítimas) quanto à sobrevivência do sector, que pouco ou nada interferem nas escolhas do consumidor ou na possibilidade de o induzirem a aumentar os seus níveis de consumo, os seus momentos de consumo ou o leque de queijos que consome.

* Imagens PUB (web)

Continua... 

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